COGNIÇÃO, MODELOS MENTAIS E TEORIA DO CONHECIMENTO: NOTAS PARA UM ESTUDO DAS REPRESENTAÇÕES MENTAIS DOS USUÁRIOS DE COMPUTADORES.
Carlos Adriano Cardoso
Introdução
A relação sujeito/objeto no tempo.
Memória e Conhecimento: o mito e a escrita
A Re-presentação do real
E os 'Helps' dos programas, ajudam? E os tutores, ensinam?.
Conclusões.
Referências Bibliográficas.
O presente trabalho tem por objetivo rever algumas questões correntes na literatura de HCI à luz das teorizações da sociologia do conhecimento, enfatizando os aspectos cognitivos envolvidos no aprendizado do uso de sistemas de softwares, e o processo de elaboração, por parte dos usuários, de diferentes representações mentais sobre o objetivo que têm à alcançar. Buscamos subsídios para a elaboração de uma 'teoria social da cognição', para o desenvolvimento sistemas de informações de tecnologias educacionais, como, tutoriais e sistemas de ajuda ao usuário.





Introdução

Qual o caminho mais curto para aprender a lidar com os computadores? Quais as estruturas cognitivas, e que habilidades se fazem necessária para adquirir o domínio neste engenhos informáticos?
Parece consensual a definição de aprendizagem como uma progressiva mudança de comportamento resultante da experiência. Na sua 'forma superior' (GAGNÉ, 1977), a aprendizagem para solução de problemas se dá através da utilização de princípios conhecidos, que devem ser memorizadas e prontamente recuperados conforme a situação exija. O grau de domínio da aprendizagem é uma função direta da capacidade de retenção da informação, e esta, depende da organização do conteúdo e de sua significação, e suas relações com outros conteúdos apreendidos.

Em sua busca de amplificar esta 'memória de trabalho' (LÉVY, 1993), a humanidade desenvolveu sucessivamente, diferentes recursos como a fala, a escrita e atualmente os computadores, que caminham cada vez mais rápidos para fusão de todas as outras formas anteriormente citadas.

E o computador é ao mesmo tempo uma ferramenta de trabalho e uma ferramenta de aprendizagem, que utiliza recursos de recuperação e organização da informação, os bancos de dados e os hipertextos, como ferramentas de aprendizagem e treinamento, auxiliando a capacidade do indivíduo de utilizar o próprio computador em todo o seu potencial para resolver problemas de uso, e trabalhar organizadamente com as informações que necessita armazenar ou recuperar para as soluções que procura para suas aplicações.

Entretanto, para a utilização deste potencial, em muitos casos, um árduo caminho deve ser percorrido, em meio de tentativas e erros. Pois conforme pesquisa publicada recentemente em uma revista especializada em informática (Revista Exame Informática, nº 95, fev./95, p.31), 64,5% dos usuários de computadores, afirmam consultar a documentação dos softwares, 54,7%, utilizam livros para aprender a manipular os softwares, enquanto 53,1% se valem dos 'Helps' do programa, e somente 12, 7% dos usuários utilizam cursos em escolas de informática para o aprendizado dos programas de software.

Este resultado nos parece apontar o sucesso relativo de uma 'política de interfaces', mas, também uma crescente difusão de um modo de perceber e modelarizar o real, conforme tentaremos argumentar a seguir. Assistimos a uma gradativa 'epidemia informática' que difunde não só uma linguagem própria, o que por si, já condiciona uma representação mental específica, mas também, a difusão de práticas que atuam sobre o comportamento e o relacionamento do homem com os objetos que o cercam.

O valor da informação depende de sua organização: a relação sujeito/objeto no tempo.

Aprendemos alguma coisa pela experiência, em que exercitamos nosso potencial de inferir a partir de tentativas e erros; aprendemos também por imitação; e também por treinamento, mas, em todos estas formas de aprender, o aprendizado se dá pela fixação de um conjunto de informações na memória de longo prazo, informações estruturadas e relacionadas a outras, portanto, informações organizadas. Sendo organizadas, podemos nos referir a elas como 'representações mentais', pois, acima de tudo, são signos decodificados, por mais discutíveis e abstrato que este conceito possa parecer. Mas, de que forma é esta representação, e a que informações outras elas se associam para fazer sentido?

Podemos memorizar uma seqüência visual de procedimentos, mas, mesmo a memória visual estaria relacionada com a linguagem, pois dela advém o sentido. E não há aprendizagem sem o sentido. O pensamento numa situação de aprendizagem por discriminação, envolve um modelo puramente conceptual, uma vez que é a estrutura semântica da língua que se fala, que controla a maneira como o indivíduo percebe e entende o mundo (MANNHEIM, 1952), o que, por sua vez influenciaria sua ações. Se a base de nosso aprendizado são palavras, mesmo enquanto imagem, onde o signo está anexado há um significado, os esquemas de pensamento são socialmente definidos pelo aprendizado. Aprendizado que modela uma forma de perceber o real, de organizar as informações.

MONTMOLLIN (1983) fala em um vocabulário próprio, de uma profissão, que o especialista domina. Neste sentido a realidade informática por está inserida no nosso cotidiano, introduz categorias que passam a ser um domínio cultural. Alguns autores (CARROL and OLSONE, (1989); SCAPIN, (1993) e WOODS E ROTH, (1988)), aludem para os diferentes modelos mentais apresentados pelo engenheiro de software quando pensa o projeto do software, e o modelo desenvolvido quando ele usa o software que projetou. A questão é o distanciamento da interface estruturada hierarquicamente em diferentes níveis, que obedecem a uma sistemática lógica de armazenamento binário de endereçamentos físicos, comandados pelos sucessivos procedimentos que são encobertos pelos toques de mouse, teclas e outros dispositivos acionais.

Lógica esta, dissimulada nos incontáveis 'gadgets' eletrônicos que fazem parte do nosso dia a dia. LEVY (1992) menciona uma 'política de interfaces' que aprimorou estas interfaces rumos ao usuário, por outro lado assistimos uma gradativa modelarização de uma lógica informacional, presente não só nos objetos que nos rodeiam, mas em todo o sistema cultural. Modelarização que se propõe na próprio atividade informacional, que é essencialmente representativa, e que permeia hoje quase todas as instituições da sociedade ocidental, modificando e introduzindo uma revolução temporal, que começou com a revolução industrial, conferido ao pensamento humano uma relação objetual em um novo tempo, o 'tempo real'.


A relação sujeito/objeto no tempo.

O que eu vejo é o que é realmente ou é, ou que eu aprendi a perceber? Para não nos reduzirmos apenas ao velho chavão da metafísica, da relação sujeito-objeto, buscamos 'construir' uma reflexão a partir da relação sujeito/objeto no 'tempo'. Por mais que queiramos fugir das polarizações, elas são um modelo bastante eficaz de 're-presentar', de organizar o real, e também o mais arcaico, o mais presente e entranhado em nossos sentidos. Quando pensamos em termos de tempo associamos esta idéia a de repetição, como as que possibilitam medir, constatar a igualdade-diferença de um tique-taque de um relógio, ou de um batimento cardíaco, ou a recorrências dos dias, luas, estações anuais, sempre baseados na noção de repetição.

E o que é o tempo, qual sua natureza? Experimentamos o tempo, mas não com os nossos próprios sentidos. Nós não vemos, nem tocamos, nem o cheiramos, nem o degustamos, nem o ouvimos. LEACH (1974, p.205), menciona que o conhecemos pela repetição, definindo os diferentes intervalos de tempo, que sempre começam e terminam; pelo envelhecimento, vivênciando a entropia dos seres vivos, que nascem, envelhecem e morrem; e ao nos relacionarmos com a velocidade com o qual o tempo passa. Ele refere-se a regularidade do tempo não como parte intrínseca da natureza; mas, como uma noção fabricada pelo homem, que nós projetamos em nosso ambiente para nossos próprios objetivos particulares. O tempo seria uma 'construção do conhecimento'. LACEY (1972, p.14) faz referência a uma 'linguagem temporal' que contém informação sobre o tempo e a localização temporal de coisas e eventos. Menciona também que os 'objetos temporais' da linguagem natural incluem coisas propriamente ditas, eventos, processos, estados, tempos, momentos, etc... Faz menção as várias noções de tempo, e em especial a um 'tempo absoluto' e a um 'tempo relativo'.

A relação entre construção do conhecimento e o tempo se resolveria num primeiro momento, com o esboço deste 'modelo baseado no conceito do tipo pendular'. Associando-se a 'representação' do tempo como uma 'descontinuidade de contrastes repetidos'. A repetição parece ser também uma estratégia para reter a informação a curto prazo. O ato de 'conhecer' é algo que se faz em um 'tempo'. 'Organizar' é uma forma de se relacionar com o tempo. 'Conhecer' possibilita a 'gestão' deste tempo. 'Organizar' os dados relacionados a um tempo diacrônico, seria a mais elementar e primitiva de todas as maneiras de encarar o tempo. Mas qual é o tempo do pensamento? Em que velocidade relacionamos fatos, coisas, em sua 'representações' para construção de uma 'memória'. 'Tempo real' seria um conceito apropriado, retomaremos isto mais adiante. Agora estamos interessados na memória, o que possibilita o conhecimento, ou pelo menos sua retenção. As representações na memória e suas vias de acesso, seriam mapas de símbolos, pontos conectados ao 'real'. Mas, não há uma, mais diversas memórias, funcionalmente de formas distintas.

Memória e Conhecimento: o mito e a escrita

LEVY (1993, p.78-9) distingui na memória declarativa, duas modalidades de memórias: a de curto prazo (ou memória de trabalho) e a memória de longo prazo. A primeira é usada para uma memorização rápida que é logo volatizada, como um número de telefone que repetimos para a discagem imediata. A segunda, seria quando, conseguimos recuperar quando queremos um número certo do telefone para quem queremos discar. As informações são gravadas na memória de longo prazo, através da ativação do núcleo do sistema cognitivo, a zona de atenção, que empenha-se em construir representações destas (ALENCAR, 1986).

Zonas de atenção que vão perdendo a intensidade na medida em que são pouco utilizadas. Sua ativação esta relacionada a possíveis caminhos de associações entre os elementos mnésicos e as representações. Esta estratégia de codificação auxiliaria na lembrança da informação. Também quanto mais complexas e numerosas forem as associações, melhores serão as performances mnemónicas; e quanto mais a informação esteja relacionada a um domínio de conhecimento ou situações que nos sejam familiares, melhor será a retenção da informação.

Nas sociedades sem escritas o mito surge como técnica de fixação da informação, codificando sob forma de narrativa algumas das representações que parecem essenciais aos membros de uma sociedade. É através da rememoração, e da recordação dos acontecimentos, que se logra dominar o tempo. ELIADE (1972) ressalta o papel do mito domínio das coisas pelo conhecimento de suas origens, origens retidas e repetidas em estórias que a tradição oral cumpre em reproduzir em detalhes. O mito implicava numa atenção voltada a habilidades verbais dos contadores de estórias com seus detalhismos e técnicas para reter a informação na memória. Técnicas que são verdadeiros esquemas, e poderiam ser reduzidos a estruturas polares.

Estas explicações pendulares, baseadas em 'organizações polarizadas', procuram solucionar a questão que opõe no tempo um homem que 'percebe', a um 'mundo real' externo a ele. Seria esta 'cisão', ou pelo menos esta maneira dual de perceber o real, que teria conduzido a 'construção' de um mundo dividido entre duas realidades opostas e conflitantes, que os dialéticos afirmam ser o 'devir' histórico? E se a ruptura do idealismo hegeliano, redunde nesta 'práxis' carregada de 'construções ideais' como se quis um dia a 'ciência histórica'. Vamos nos preocupar também em apontar o que não é também uma manifestação idealista 'camuflada'? Esta voluptuosa busca de mesurar o real, de reconstruir um mundo escalar, dos adeptos das teses materialistas e dos empiristas clássicos, para quem 'só se conhece aquilo que se experimenta'.

Parece ser mais evidente para os sentidos, perceber e diferenciar forças opostas, do que perceber as miríades de variações possíveis que vão de um pólo ao outro. Da luz e da escuridão, do dia e da noite, separaram-se o bem do mal; o eu do outro; o indivíduo da instituição; a comunidade da sociedade; o prazer da dor; o estímulo da resposta; o zero e o um. Não é por nada, que presenciamos a eficácia da 'virtualização do real' dentro de uma lógica binária, que dá suporte ao modelo da 'máquina digital'. Não que a realidade seja dual, mas a dualidade está no princípio da construção da nossa individualidade, cindida entre o 'ser' e o 'não ser' cunhado num universo impregnado 'cartesianismo- shekspereano'. Não é um acaso a filosofia 'taoísta' ser tão difundida no ocidente, ela dá conta satisfatoriamente da questão dual da unidade, tão difundia, tão presente no imaginário mitológico humano.

Dentre as variações das 'reduções polares', há opções ou 'construções', que eliminam esta cisão. Sujeito-objeto seriam uma coisa só, uma construção única, expressões desta massa viva que é a 'cultura humana', com preponderâncias, em que dependendo das circunstâncias um agiriam sobre o outro, numa 'fragmentada via de duas mãos'.

O sujeito torna-se objeto ao tentar 'distanciar-se' do 'ato de conhecer', por 'distanciar' entendo, 'conhecer' o ato de 'conhecer'. Ter o 'ato de conhecer' como 'objeto' de conhecimento.

A elementarização, a 'objetificação' parece ser uma etapa elementar do 'ato de conhecer', eu conheço 'objetos', que são 'construções' lingüísticas. As coisas são palavras que eu aprendo a relacionar em meu mundo 're-construído'.

A Re-presentação do real

Segundo YOURDON et alii(1992, p.14), três métodos básicos são utilizados pelas pessoas para 'compreensão do mundo real': diferenciação de objetos particulares e seus atributos; distinção entre objetos como um todo e entre suas partes componentes; e, formação de, e distinção entre, as diferentes classes de objeto. (1º uma árvore e seu tamanho; 2º a árvore e seus galhos, e 3º a classe das árvores e sua distinção da classe das rochas).

A psicologia contemporânea e a neurobiologia apontam na direção de um sistema cognitivo humano, baseado em uma arquitetura na qual diferentes módulos especializados organizam nossas percepções, nossa memória e nossos raciocínios, de forma bastante restritiva. Para LÉVY (1993, p.63), o processo de fusão ocorreria através das tecnologias cognitivas, como a leitura, por exemplo. "O ser cognoscente é uma rede complexa na qual os nós biológicos são redefinidos e interfaciados por nós técnicos, semióticos, institucionais, culturais". Para PENROSE (1991), esta fusão e promovida pela 'consciência' esta forma tão mistificada de distanciar-se da ação de separar-se do pensamento, de refleti-lo sobre um espelho, virtualizá-lo.

Vemos da mesma forma, a 'cultura' como o elemento de mediação entre o contínuo que é o sujeito e o objeto. Damos ênfase aqui a 'cultura técnica', percebendo-a como a manifestação, uma construção, em constante processo de recombinação, cada um encerrados diferentes sentidos. Não determina, nem tão pouco é determinada, nem causa nem conseqüência, é uma construção de enredos, de sentidos que estão a todo momento sendo 're-interpretados'.

Esta mediação é um ato de comunicação, que define a situação que vai dar sentido às mensagens trocadas. Para LÉVY (1993, p.21), a comunicação só se distingue da ação em geral porque visa mais diretamente ao plano das representações. Para ele, longe de ser apenas um auxiliar útil à compreensão das mensagens, o contexto é o próprio alvo dos atos da comunicação. Também considera os sistemas cognitivos como combinações sujeito/objeto ou redes de interfaces compostas. E declara que os processos intelectuais não envolvem apenas a mente, colocam em jogo coisas e objetos técnicos complexos de função representativa e os automatismos operatórios que os acompanham. Como a memorização visual de seqüências de ações que já nos referimos anteriormente.

LÉVY (1993, p.186) é enfático em declarar que as técnicas não determinam nada, e que seriam frutos de longas cadeias intercruzadas de interpretações e que requerem elas mesmas, que sejam interpretadas, conduzidas para novos devires pela subjetividade em atos dos grupos ou dos indivíduos que tomam posse dela. Considera que as tecnologias intelectuais desempenhariam um papel fundamental nos processos cognitivos, exemplificando como a escrita mudou totalmente a percepção e a capacidade do homem de manipular a imaginação, para ele, é pela dimensão objetual que atravessa a cognição.

Na mesma linha de pensamento, MORAES (1991, p.5) faz menção a uma 'Idade da Máquina' relacionada a um modelo de pensamento analítico, determinístico, baseados nas doutrinas do reducionismo e do mecanicismo, substituída pela atual 'Idade dos Sistemas', sintético e probabilístico, fundamentado no expansionismo e na teleologia. Pensamento e técnica se fundem na construção de todas as representações sociais, mudando os paradigmas das formas de conhecer, definindo em parte o ambiente, as restrições materiais das sociedades.

LÉVY (1993, p.186) ressalta que o estado da técnica, influi efetivamente sobre a topologia do que chama a 'megarede cognitiva', sobre o tipo de operações que nela são executadas, os modos de associação que nela se desdobram, as velocidades de transformação e de circulação que as representações que dão ritmo a sua perpétua metamorfose. Megarede de um imenso cérebro, composto de bilhões de neurônios-homens, e seus contínuos fluxos informacionais. Fluxo do qual tudo faz parte, pensamento ou matéria, tudo compõe este imenso sistema da 'ecologia cognitiva'.

Todo esta argumentação nos conduz a acreditar, que a despeito da dificuldades de interface, lá onde falharam as políticas de interface, há uma motivação no ar, e hoje o desenvolvimento das habilidades requeridas para manipulação desta realidade digital, torna-se tão vital quanto aprender a escrever.

Se de um lado, os projetistas de fatores humanos buscam compreender como se processa o pensamento e a ação dos usuários ante aos problemas surgidos decorrentes da tarefa, há uma forte massificação em todos os meios da mídia moderna de difundir e banalizar os conhecimentos necessários a utilização do computador, que se transforma, num elo comum entre as diferentes especializações do mercado de trabalho, com sua linguagem e terminologia própria que costura e encontra-se em todas as profissões que dela faz uso.

Parte desta política de interfaces, se consubstancia numa área específica de conhecimento, a Interação Homem/Computador, com sua problemática própria, ainda que tomada como base das conquistas e derrotas da psicologia cognitiva, e psicologia do aprendizado. Ainda que ainda afeita a estas perspectivas laboratoriais, e que não tenha ousado cair no campo das teorizações mais amplas, alguns problemas demarcados devem ser frisados. E entre eles é o potencial elucidativo e explicativo que os sistemas, por mais amigáveis que sejam, devem propiciar em caso de necessidade. São eles os, sistemas de ajudas e os tutores de programa.


E os 'Helps' dos programas, ajudam? E os tutores, ensinam?.

O artigo de ELKERTON (1988), propõe referencial teórico, com uma ampla revisão da literatura sobre esta questão. Também define como o objetivo destes 'helps de programas' sob a forma de diálogos, apresentar detalhados procedimentos para operacionalização da interface do sistema, que poderá ser desconhecido pelo usuário.

Este autor assenti que, embora potencialmente útil para usuários habilitados, estes manuais online poderão ser completamente ineficazes para outros usuários menos habilitados ou ocasionais, que necessitem de detalhadas informações sobre como operar a interface do programa para uma específica tarefa, e que vêem-se constantemente no dilema de aprenderem procedimentos adicionais sobre a interface do software enquanto tentam completar a tarefa que se propõem.

Assinala também que não é incomum para os helps onlines aumentarem o tempo requeridos aos usuários para a resolução de problemas e que a mais importante razão para o insucesso destes sistemas de ajudas onlines, seria seu não enfoque sobre as tarefas e os objetivos dos usuários. Muitos dos 'online helps' não seriam mais do que versões eletrônicas dos pesados manuais de referências dos comandos e funções de interface do computador.

CARROL and OLSONE, (1988) acentuam a tendência destes usuários iniciantes, à construção de um 'modelo de representação e de ação que segue uma 'seqüência simples' de procedimentos orientadas à tarefa, que é pouco considerada por muitos dos 'helps onlines', conforme pudemos avaliar numa rápida análise de alguns programas bastante difundidos. O relato destes autores aborda a questão da construção de uma representação mental necessária ao desenvolvimento de uma habilidade operacional destes softwares. E o distanciamento entre as representações de usuários e projetistas, e mesmo os 'modelos prescritos por estes últimos para primeiros, seria uma das fontes do insucesso de algumas interfaces, e o motivo de algumas pesquisas por parte dos projetistas de fatores humanos.

O aprendizado da utilização destes dispositivos parece, como de muitos outros, ser incremental. Parece que a uma familiarização gradativa com o jeito como a máquina se comporta. O acumulo do conhecimento é tratado em vários níveis (MONTMOLLIN, 1983; CARROL and OLSONE, 1988; BARTHET, 1993) mais, é nítida a distinção feitas por estes autores entre noviços e especialistas, especialistas que muitas vezes desenvolvem uma lógica própria, voltada para sua aplicação, lógica que nem sempre coincide com a máquina. Lógica que pode ser estruturada num conjunto de procedimentos que permitem ao usuário leve à termo suas tarefas.

Os usuários tem um modelo mental bastante claro de suas tarefas, tomemos com exemplo o depoimento de um usuário, profissional da área de Comunicação Visual, a quem indagamos como fazia para aprender a usar um software específico para sua especialidade. Seus conhecimentos sobre editoração gráfica lhe compelem a explorar qualquer novo software, buscando no geral seus recursos, ou seja, o que o software pode fazer, em seguida, se preocupa como ele poderá fazer isto. A lógica do usuário é sempre voltada à tarefa, e o computador também, se encararmos cada procedimento como uma tarefa interna da máquina. Mas, é este desconhecimento das entranhas da máquina, que conduz o noviço a construir simples regras que prescrevem sequências de ações, que denominaremos aqui como 'fórmulas de bolo', que ele repete para alcançar alguns resultados.

Evidentemente que usuário de edição de textos se distância bastante de um usuário de desktop publishing, e ele deveria ser caracterizado, como os outros iniciantes, como dotado de uma 'representação orientada a objetivo com relação ao uso do software, pelo menos no que toca a exploração das potencialidades do software, conforme CARROL and OLSONE(1988), e também BARTHET (1993), que apresentam ambos a diferenciação, que já nos referirmos, das representações entre usuários, projetistas de interface e engenheiros de softwares, mencionando a necessidade de se classificar outros possíveis modelos.

Mas aqui surge a questão do profissional especialista, que tem um modelo mental de sua atividade. Ele tem claramente alguns objetivos bem mais complexos que o datilógrafo de textos, e ele tem também infindas possibilidades e estratégias para levar a termo seus objetivos, seja de manipulação de imagens ou textos. Seu modelo mental, difere, de um outro noviço entrevistado, que cumpria sua tarefa, a partir da memorização de algumas seqüências de combinação de teclas, sem que estas fizessem o menor sentido para o depoente. A despeito de utilizar recurso de edição que não estão presente nas máquinas comuns de escrever, sua relação com o computador ia pouco além disto, e as seqüências operatórias não passam de rituais que lhe propiciam o resultado desejado. As ajudas, jamais, possibilitam respostas adequadas, e o aprendizado é sempre recorrido a alguém mais experiente. Por certo, a distância entre os dois usuários, se encontra em suas estruturas cognitivas, além evidentemente, das bases motivacionais. Mas, porque, situando-se no mesmo nível de noviços, funcionam os sistemas de ajudas de forma diferente, uma vez que o primeiro, dele se utiliza para aprender como poderá atingir seu objetivos.

Conclusões.

Não há uma nítida, direção no que toca a teorização de modelos mentais, a despeito de conceber a cognição como um sistema de entradas e saídas, e estipular, como modelo mental a visão da tarefa relacionada as possibilidades do software, acreditamos estarmos tocando num problema crucial buscando relacionar estruturas cognitivas e relações sociais de produção. Haverá uma diferença clara em estruturas cognitivas habilitadas para o projeto, e para decisão, que diferencie dos voltados a operacionalização?

Existe um certo vácuo nas pesquisas sobre os sistemas de ajuda online, e os próprios sistemas se modificam hoje, inseridos em uma realidade multimídia. Mesmo que, ainda a maior parte dos usuários de computadores, o utilize para processamento de texto, e mesmo que a maioria não domine sequer alguns conhecimentos específicos do domínio do datilógrafo, e utilizem o computador com uma mera ferramenta de datilografia, é razoável que o próprio uso indique caminhos que aos poucos transformarão estas máquina burra numa máquina falante. Ainda que a rejeição de alguns indique uma total incompatibilidade com a lógica inerente de suas arquiteturas, elas estão disseminadas na nossa cultura, e acabarão ecoando no espaço limitado de suas telas.

Hoje, a questão da interface, passa por normas de qualidade, e padrões mundialmente aceitos e disseminados. São as 'janelas' que se transformaram em portas abertas para o sentido, e toda dimensão objetual de tudo que você vê, toca e manipula na tela. Tais como a mente e os modelos mentais, os softwares caminham para uma realidade includente, jamais excludentes, e da mesma forma, que eles tornam-se padronizados, padronizam nosso conhecimento. Literatura, instituições, mídia, um sem fim de dispositivos caminham para inocular este novo padrão iconográfico de uma sociedade iconoclástica. E ali, onde outrora, a imagem passiva da mídia estipulava os padrões mentais e comportamentais, hoje isto é ditado pela 'multi-mídia', dentro de uma realidade puramente ativa, dentro de um conceito interativo. Puro reflexo ou determinante de uma nova fase de construção do conhecimento humano sob o primado da modelarização da realidade.

Não há com escapar, por mais penoso, tortuoso, difícil, eles cumprem o papel de transformar os processos mentais, e a despeito das críticas neste sentido, elas refazem o caminho do aprendizado humano, possibilitando novas 'estratégias cognitivas'(OLIVEIRA e CHADWICK, 1984, P.62), ou seja, eles possibilitam meios para o aprendiz administrar seu próprio processo de aprendizagem, ele ensina o aprendiz a aprender.

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