|
A FORÇA DA MENTE
O cérebro bem usado melhora
com o tempo,
estica a vida útil e previne
as doenças da velhice
Thales Guaracy e Cristina
Ramalho
Antes de continuar a leitura desta reportagem,
pare um instante e olhe a sua volta. O mundo que você vê é
real ou imaginário? A luz que se projeta a seu redor seria observada
e sentida da mesma forma se você não estivesse aqui? As cores
fariam algum sentido se alguém não as pudesse observar, catalogar
e interpretar? Os sons produziriam o mesmo efeito se não existissem
ouvidos para captá-los? O frio ou o calor teriam alguma importância
na ordem geral do universo se não fosse você que os estivesse
sentindo? Tudo que você vê, ouve e sente reflete o mundo exterior.
A forma como alguém percebe, interpreta ou reage a isso, no entanto,
é pura criação do cérebro, a mais maravilhosa
e elaborada produção da vida na Terra. "O que o cérebro
faz o tempo todo, dormindo ou acordado, é criar imagens", diz o
neurocientista Rodolfo Llinas, da Universidade de Nova York. "Luz nada
mais é do que radiação eletromagnética. Cores
não existem fora de nossa mente. Nem os sons. O som é um
produto da relação entre uma vibração externa
e o cérebro. Se não existisse cérebro, não
haveria som, nem cores, nem luz, nem escuridão."
Desde que os seres humanos adquiriram a capacidade
de pensar sobre sua própria existência, o cérebro é
um desafio permanente ao entendimento. Aristóteles, o filósofo
grego que viveu 350 anos antes de Cristo, acreditava que o pensamento vinha
de um órgão quente e pulsante: o coração. Para
ele, o cérebro servia apenas para refrigerar o organismo. Foi mais
ou menos assim que a mente humana foi explicada durante milênios.
No século XVIII, graças ao trabalho do cientista italiano
Luigi Galvani, provou-se que os músculos se moviam por descargas
elétricas — e que o cérebro podia produzi-las. Desde então,
desvendar os segredos da mente tem sido uma das mais extraordinárias
aventuras humanas. Nada se compara, porém, aos avanços obtidos
nessa área nos últimos anos. Uma infinidade de novas descobertas,
feitas em laboratórios e centros de estudos ao redor do mundo, tem
revelado o cérebro como um órgão mais fascinante,
complexo e poderoso do que antes se imaginava. Descobriu-se que, ao contrário
dos outros órgãos do corpo humano, ele pode melhorar seu
desempenho durante a vida. A única exigência é que
seja permanentemente treinado e exercitado em atividades intelectuais.
"Atualmente, as pessoas vivem obcecadas com ginástica, dietas e
atividades para melhorar a saúde do corpo, mas pouca gente imagina
que o cérebro também deve ser exercitado o tempo todo", escreveu
o grande mestre em xadrez Raymond Keene num artigo recente para a revista
britânica The Spectator. "A melhor maneira de viver mais e
melhor é botar o cérebro para trabalhar."
Vida mais longa — O cérebro bem
estimulado em tarefas como leitura, aprendizado de novas línguas,
resolução de problemas matemáticos ou mesmo em tarefas
rotineiras no trabalho pode esticar a longevidade de uma pessoa e evitar
que ela sofra de problemas típicos da velhice, como a senilidade
e a perda de memória. Uma pesquisa realizada entre pacientes com
mais de 65 anos, todos de um mesmo bairro e mesma classe social, no Hospital
Francês de Buenos Aires, revelou que 38% deles tinham desenvolvido
o mal de Alzheimer, doença degenerativa que apaga mecanismos da
memória coordenadores de movimentos naturais, como os da locomoção.
Esse índice, contudo, caía para apenas 7% entre os pacientes
com nível de instrução universitário. Quanto
mais informação útil é armazenada no cérebro,
melhor é seu desempenho. Maior também é o benefício
que ele leva a todo o resto do organismo ao qual está ligado. "O
cérebro é uma máquina para usar e gastar", diz o professor
Ivan Izquierdo, especialista no estudo da memória do departamento
de bioquímica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS.
"Quem estuda ou tem uma vida intelectualmente ativa vive melhor e geralmente
mais." O uso adequado das potencialidades do cérebro também
pode multiplicar muitas vezes a capacidade de aprendizado de uma criança,
melhorar o desempenho de uma pessoa no emprego e aprimorar seus vínculos
familiares e sociais.
O cérebro é uma máquina maravilhosa
que desempenha múltiplas tarefas biológicas. Pesando pouco
mais de 1 quilo e representando apenas 2% do peso total de um homem adulto,
ele gasta 20% de toda a energia despendida no corpo. Entre uma orelha e
outra de uma pessoa, estima-se que existam mais conexões neurológicas
do que estrelas na Via Láctea. Se alguém tentasse contar
essas conexões, chamadas de neurônios, gastando um segundo
em cada uma delas, levaria 32 milhões de anos para concluir a tarefa.
É o cérebro que comanda as funções que asseguram
a reprodução e a sobrevivência da espécie. Pense
na batida inconsciente do coração, nas pálpebras piscando,
na respiração contínua dos pulmões, nos alimentos
sendo processados pelos intestinos, numa perna que se move. Tudo isso é
organizado e dirigido pelo cérebro. Pense nas suas emoções,
na atração sexual, no amor entre pais e filhos, nos sonhos
e pensamentos. Eles também são produtos do cérebro.
Sua missão mais elementar é recolher os estímulos
externos, captados pelos sentidos, e transformá-los em impulsos
elétricos que percorrem os neurônios. Toda essa informação
é catalogada e arquivada na memória. É a ela que o
cérebro recorre quando precisa tomar decisões, comandar os
movimentos corporais e organizar o pensamento.
Aparato tecnológico — O cérebro
humano, no entanto, é mais que isso. É a única criação
conhecida do universo que tem a capacidade e a tarefa de desvendar-se a
si mesma. "Penso, logo existo", afirmou o filósofo René Descartes,
no século XVII, o primeiro a concluir que a consciência, decorrente
da atividade cerebral, era a prova primordial da existência do ser
humano. Desde que a vida surgiu na Terra, há cerca de 3,5 bilhões
de anos, milhões e milhões de espécies surgiram, evoluíram
ou desapareceram da face do planeta. Nenhuma desenvolveu uma ferramenta
biológica tão sofisticada quanto o cérebro humano.
Alguns cientistas acreditam que, estatisticamente, ele é uma ocorrência
raríssima. Tão rara que tornaria improvável a existência
de seres inteligentes em outras regiões do universo. "O aparecimento
de vida inteligente na Terra foi muito mais difícil do que os cientistas
sempre imaginaram", escreveu Ernst Mayr, veterano professor da universidade
americana Harvard, considerado o maior biólogo vivo, autor de um
livro essencial sobre a evolução das espécies (The
Growth of Biological Thought). "Só isso já deveria desestimular
qualquer idéia a respeito de inteligência extraterrestre",
afirma Mayr.
As novas descobertas, que permitem a melhor compreensão
de como funciona o cérebro e como pode ser melhorado, devem-se ao
impressionante aparato tecnológico desenvolvido pela ciência
nos últimos anos. São aparelhos que "lêem" o pensamento
pela medição do fluxo sanguíneo e dos impulsos elétricos
que trafegam pelos neurônios. Drogas que conseguem congelar determinada
atividade cerebral numa cobaia, de modo que os pesquisadores possam dissecá-la
para entender como se processou. Técnicas refinadas de microbiologia,
que permitem analisar cada uma das estruturas microscópicas dos
neurônios. Análises genéticas, usadas para estudar
a evolução do órgão nas diferentes espécies
vivas. O resultado da soma de tudo isso é espetacular. "Finalmente
estamos entrando dentro do cérebro", diz o professor Gilberto Xavier,
do departamento de fisiologia do Instituto de Biociências da Universidade
de São Paulo. "Para a ciência, a década de 90 está
sendo a das descobertas sobre o cérebro. E acredito que o século
XXI deverá ser o século cerebral."
O desenvolvimento natural do cérebro se
dá na mais tenra infância. Até os 8 anos, a criança
já possui conectados 90% dos neurônios que carregará
ao longo da vida. Aos 17 anos de idade, o cérebro humano atinge
os 100% do seu estágio de crescimento. No entanto, estima-se que
apenas 30% da capacidade intelectual das pessoas seja inata, determinada
pela herança genética. Os outros 70% vêm do uso e do
aprendizado. Isso significa que, assim como existem seres humanos mais
altos ou mais velozes, existem pessoas com maior capacidade orgânica
cerebral. É isso que faz a diferença entre uma pessoa mais
inteligente e outra menos. O cérebro tem milhões e milhões
de células conectadas, entre si, por neurônios — os microscópicos
filamentos nervosos que conduzem os sinais elétricos. Cada neurônio
pode ligar-se a outras 100000 terminações como ele. O número
de combinações possíveis pode chegar quase ao infinito.
As conexões entre os neurônios, por onde passa a informação
cerebral, são chamadas de sinapses. Quanto maior for seu número,
mais inteligente a pessoa será. "É a capacidade humana de
produzir essas combinações, a partir de dados registrados
no cérebro, que podemos chamar de inteligência", diz o fisiologista
Gilberto Xavier, da Universidade de São Paulo.
Até algum tempo atrás, imaginava-se
que um cérebro jovem, em sua plena vitalidade biológica,
fosse muito mais poderoso e criativo do que um outro já maduro e
desgastado pela idade. A matemática fornecia o maior dos argumentos
para os defensores dessa teoria: quase todas as grandes equações
matemáticas foram propostas ou decifradas por gente com menos de
30 anos. Albert Einstein tinha apenas 26 anos quando apresentou sua teoria
geral da relatividade — a mais revolucionária de todas as elaborações
matemáticas, que lhe valeu o Prêmio Nobel de Física,
quinze anos depois. O argumento é forte, mas ele se baseia numa
idéia ultrapassada a respeito da mente humana. As novas descobertas
estão mostrando que a inteligência não se limita à
capacidade de raciocínio lógico, necessária para propor
ou resolver uma complicada equação matemática. Os
testes de QI, um dos antigos parâmetros usados para medir a inteligência,
já não servem mais para avaliar a capacidade cerebral de
uma pessoa.
Inteligência emocional — A inteligência
é muito mais que isso. É uma soma inacreditável de
fatores, que inclui até os emocionais. Uma pessoa excessivamente
tímida ou muito agressiva terá sempre problemas para conseguir
um bom emprego, ascender na profissão ou ter bom relacionamento
familiar, por maior que seja seu QI. O que os novos estudos estão
mostrando é que um cérebro jovem tende, sim, a ser mais inovador
e revolucionário. Mas, como um bom vinho ou uma boa idéia,
ele também pode amadurecer e melhorar com o tempo. Basta ser estimulado
e exercitado. A ciência, a arte e a literatura estão repletas
de exemplos. Charles Darwin viajou para as ilhas do Pacífico em
busca de uma explicação para a evolução dos
seres vivos quando tinha apenas 22 anos. Mas só muito mais tarde,
aos 55 anos, publicou A Origem das Espécies, obra que revolucionou
o estudo da biologia e a compreensão da vida na Terra. Karl Marx
tinha 26 anos quando publicou suas primeiras idéias num estudo chamado
Manuscritos Econômicos e Filosóficos. Só duas
décadas mais tarde, porém, com 49 anos, concluiu sua obra-prima,
O Capital. Da mesma forma, Leonardo da Vinci começou a desenvolver
sua genialidade ainda jovem, em Florença. Só aos 54 anos,
contudo, criou a Mona Lisa, sua mais célebre pintura, mesma
época em que fez vários de seus inventos e estudos sobre
a anatomia humana. "Isso explica por que muitos escritores atingem o auge
de sua carreira justamente no fim da vida", afirma Gilberto Xavier, da
USP. "É o caso do argentino Jorge Luis Borges, que alguns anos antes
de morrer estava no auge da sua capacidade criadora."
Numa pessoa intelectualmente ativa, o cérebro
pode melhorar cada vez mais. Numa outra, que não lê, não
estuda, não trabalha nem se envolve em atividade desafiadora para
a mente, ocorre o oposto. O cérebro decai e envelhece, como qualquer
outra parte do corpo não utilizada. "Uma mente sem uso se deteriora
tanto quanto uma perna que não se exercita", diz o chefe do Departamento
de Gerontologia da Universidade George Washington, Gene Cohen. Há
pesquisas curiosas a esse respeito. Pessoas que trabalham e saem de férias
por uma semana ao retornar mantêm praticamente intacto o número
de sinapses cerebrais associadas às atividades no trabalho. Quando
as férias são mais longas que um mês, no entanto, a
queda é expressiva. Isso explica aquela sensação de
preguiça que toma conta das pessoas ao final de férias mais
prolongadas. Ao retornar ao trabalho, o cérebro precisa ser reeducado
e exercitado novamente para recuperar o desempenho perdido. Isso também
explica por que pessoas que se aposentam e não se dedicam a nenhuma
outra atividade estimulante muitas vezes envelhecem e até morrem
precocemente.
Atividades complexas ou inovadoras são
a melhor forma de exercitar o cérebro. Jogar xadrez sempre foi considerado
um bom exercício cerebral, porque exige concentração
e capacidade de inventar saídas para novas situações.
Outra maneira apontada pelos especialistas é a leitura. "Quando
alguém lê, está criando novas imagens, aprendendo novos
conceitos e até exercitando a fala", diz Ivan Izquierdo, da UFRGS.
"Enquanto as pessoas lêem, músculos da língua quase
imperceptivelmente se mexem." Para expandir as ligações cerebrais,
o ideal é não desistir da leitura de textos um pouco mais
complicados. Outra maneira é viajar para lugares desconhecidos e
surpreendentes. Até mesmo arrumar os móveis da casa de outra
forma é uma tarefa estimulante para a atividade cerebral. Poucas
experiências são tão desafiadoras para o intelecto
quando aprender uma nova língua. Ela provoca uma reação
em cadeia no cérebro, que se vê convidado a criar novas combinações
para decifrar e armazenar palavras até então desconhecidas.
São essas novas conexões, geradas pelo desafio diante da
novidade, que aumentam a capacidade do intelecto de trocar informações
consigo mesmo.
Alargar fronteiras — Numa pesquisa recente
feita nos Estados Unidos, o neurocirurgião George Ojemann, da Universidade
de Washington, mediu com eletrodos reações cerebrais em pessoas
bilíngües. Primeiro, pediu que elas pensassem determinadas
palavras em diferentes idiomas sem pronunciá-las. Depois, propôs
que repetissem a experiência lendo essas mesmas palavras em silêncio
e repetindo-as em voz alta. Em cada etapa da experiência, os neurônios
ativados pelo cérebro eram diferentes. A mesma palavra pensada,
lida e repetida em voz alta em inglês e espanhol, por exemplo, gera
seis diferentes respostas no cérebro. "O mesmo neurônio que
é ativado quando se ouve uma palavra não reage quando ela
é pronunciada em voz alta", explicou Ojemann. A conclusão
é óbvia: uma pessoa alfabetizada e poliglota, que consiga
ler e falar em diferentes idiomas, tem uma capacidade cerebral multiplicada
várias vezes em relação a outra, analfabeta, que mal
consiga expressar-se verbalmente num único idioma. Estudar, portanto,
é a forma mais eficiente de alargar as fronteiras da mente humana.
O avanço nos estudos sobre o cérebro
já permite à medicina grandes vitórias no tratamento
de vários problemas e doenças. Antigamente, acreditava-se
que cada tipo de informação ou função cerebral
era concentrado em uma região particular do cérebro. Hoje,
sabe-se que cada célula pode desempenhar múltiplas funções,
embora haja alguma especialização. Dados ligados à
emoção são mais armazenados no hemisfério direito
do cérebro, enquanto os ligados à razão e à
linguagem ficam do lado esquerdo. Mas sua maleabilidade permite a adaptação
a situações imprevistas, como uma lesão decorrente
de um acidente. Um caso exemplar é o do locutor Osmar Santos, que
perdeu parte da massa encefálica numa trombada de automóvel,
em 1994. Hoje, graças a exercícios específicos para
recuperar a atividade cerebral, ele já se comunica por gestos e
até recobrou um vocabulário incipiente. "O cérebro
é adaptável e capaz de se reorganizar", diz o neurocirurgião
Jorge Pagura, atual secretário de Saúde do município
de São Paulo, que participou do tratamento de Osmar. "Quando parte
dele sofre algum tipo de lesão, outras áreas passam a compensar
a falha."
O maior salto científico, no entanto, está
no terreno da memória, a ferramenta mais essencial do cérebro.
Antes também se acreditava que a memória de longo prazo e
a recente eram formadas em lugares distintos do cérebro. Uma outra
teoria sustentava que a memória de longo prazo seria um resquício
da memória recente. Estudos realizados pela equipe do professor
Ivan Izquierdo, no Rio Grande do Sul, que estão sendo publicados
numa série de artigos na revista científica britânica
Nature, chegaram a uma conclusão diferente. Eles mostram
que ambos os tipos de memória se formam nas mesmas células,
mas de forma independente. O cérebro cria uma memória que
dura apenas seis horas, para o caso de precisar da informação
logo em seguida. E cria outra que pode perdurar a vida inteira. São
registros vivos, impressos nas proteínas que formam o conteúdo
das células. Eles vão se modificando com o tempo. "O cérebro
é essencialmente dinâmico e funciona como uma biblioteca onde
sempre cabem mais livros", explica Cláudio Guimarães, do
Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, em São
Paulo. A memória é capaz de descartar dados considerados
irrelevantes, ou resgatar dados praticamente perdidos quando eles se tornam
cruciais. "Quanto mais informações são ali armazenadas,
mais ágil o cérebro se torna para localizar o estoque antigo",
diz Guimarães. O melhor conselho para quem quer turbinar o próprio
cérebro, portanto, é: use e abuse.
Você sabia que...
Apenas
30% da capacidade intelectual de uma pessoa se deve a atributos inatos
do cérebro. Os outros 70% são desenvolvidos graças
ao aprendizado
A tarefa
de contar cada terminação nervosa do cérebro à
velocidade de uma por segundo levaria 32 milhões de anos
No início
da gravidez, os neurônios do feto crescem à razão de
250.000 por minuto. Metade deles morre antes de o bebê nascer. É
uma forma seletiva de apurar a qualidade das células cerebrais
Vincent
Van Gogh provavelmente sofria de epilepsia no lobo temporal, que fica na
região logo acima da orelha. Esse tipo de problema provoca descargas
elétricas que causam hiperatividade no cérebro
Com
o peso aproximado de um pacote de açúcar e 2% do peso de
um homem, o cérebro consome sozinho mais de 20% da energia requerida
pelo corpo
O compositor
francês Maurice Ravel sofreu uma lesão cerebral no hemisfério
esquerdo do cérebro que o deixou incapaz de ler partituras, nomear
notas musicais, tocar piano e escrever música. Outras atividades,
como reconhecer melodias e conferir a afinação exata dos
instrumentos, ficaram intatas
Estima-se
que existam mais conexões neurológicas num único cérebro
do que estrelas na Via Láctea |
A construção do superbebê
|
AeD: escola
desde o berço |
Foto: Egberto Nogueira |
|
No passado, acreditava-se que a criança
só podia entrar na escola aos 5 anos. Hoje, sabe-se que quanto mais
cedo melhor. Os três primeiros anos de vida são os mais importantes
para o desenvolvimento cerebral. É nessa fase que se desenvolve
mais da metade dos neurônios humanos, de acordo com os estudos científicos.
É também a melhor fase de aprendizado. "Os arquivos do cérebro
nessa idade são como fitas virgens e o acesso à informação
é direto", explica a pedagoga Julia Manglano, que criou há
um ano em São Paulo o Centro de Aprendizado e Desenvolvimento, AeD.
O centro importou um método espanhol, com a missão de ajudar
os pais a desenvolver o potencial máximo dos filhos desde o nascimento.
No AeD trinta crianças estão inscritas
num projeto chamado Superbebês. A maior parte é de recém-nascidos.
Nesses cursos, os bebês ouvem música clássica para
desenvolver a inteligência auditiva. O método é aconselhado
também para estimular crianças durante o aprendizado de língua
estrangeira. Graças à organização dos sons,
com começo, meio e fim, ele ajuda a oferecer noções
elementares de matemática. Os bebês são estimulados
a engatinhar, equilibrar-se, subir e descer rampas como forma de desenvolver
a capacidade motora. Também observam obras de arte, para aprimorar
a percepção de cores, e têm à sua disposição
brinquedos para desenvolver o senso tátil, como uma minhoca de pano
com várias texturas. Com 1 ano, os bebês já começam
a aprender uma segunda língua. Como estão aprendendo os fonemas,
poderão falá-la no futuro sem sotaque. |
A memória tem cura
O mal de Parkinson e o mal de Alzheimer são
as principais doenças degenerativas da memória. Ambas progressivas
e incuráveis, agora estão mais próximas de ser tratadas.
Em janeiro passado, a fisioterapeuta Maria Elisa Piemonte, que fez sua
tese de mestrado na Universidade de São Paulo sobre o tratamento
do mal de Parkinson, realizou um experimento com dezessete idosos que sofrem
da doença. Sabe-se que o doente de Parkinson (como o papa João
Paulo II) perde pedaços da memória que comanda os movimentos
instintivos. Por isso, pode fazer movimentos quando lhe é pedido,
mas nem sempre consegue levantar-se sozinho da cama. Com o uso de uma lista
de instruções, um guia para determinar qual movimento sucede
o outro, ela fez com que os pacientes utilizassem a memória declarativa
— os movimentos coordenados pela razão — para executar outra vez
operações como a de levantar a mão ou abotoar a camisa.
Hoje, os dezessete pacientes ainda tomam medicamentos contra a doença,
mas caminham e reaprenderam a fazer uma série de movimentos de maneira
natural, que foram reincorporados pelo cérebro. Nenhum deles precisa
mais executar a lista decorada.
Já o mal de Alzheimer, que atinge milhões
de pessoas no mundo, entre eles o ex-presidente americano Ronald Reagan,
vai destruindo as células do cérebro que produzem acetilcolina,
um neurotransmissor. O doente esquece quem foi, o que fez e perde a capacidade
de aprender. Existem dezessete drogas no mercado sendo testadas e dois
medicamentos mais comumente usados, mas de eficiência discutível
e fortes efeitos colaterais. Em novembro será inaugurado um laboratório
de neurociências no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas,
que vai trabalhar com pesquisas de ponta em genética molecular para
tentar a cura do Alzheimer e da esquizofrenia. Com orçamento de
2 milhões de dólares, o psiquiatra Wagner Gattaz pretende
fazer transplantes com células geneticamente modificadas em laboratório,
que substituem as células com os genes de Alzheimer. |
|
|