Contribuições para o PROTEM/CNPq 99

Projeto: Ambiente Imersivo de Ensino Aprendizagem Colaborativa

 

 

• A Potencialidade da Realidade Virtual

A definição de realidade virtual é controvertida, mas inicialmente podemos considerar que esta é uma simulação gerada por computador de cenários/objetos, reais ou imaginários, que proporcionam a sensação de um espaço real para o usuário. Para PINHO:

A interface de Realidade Virtual procura ser semelhante à realidade, buscando a sensação de presença em um ambiente informacional, através de uma ilusão gerada por computador. Esta sensação de presença ou imersão, constitui-se na principal característica da Realidade Virtual. A qualidade desta imersão, ou grau de ilusão, ou quão real esta ilusão parece ser, depende da interatividade e do grau de realismo que o sistema é capaz de proporcionar. (1988b/ Internet via WWW, ênfase minha)

 

Os sistemas de realidade virtual variam em função da intensidade de realismo e interatividade que cada um possibilita, indo desde o sistema não imersivo (aquele em que o usuário entra em contato com a realidade virtual apenas através da tela do seu monitor do computador) até o video mapping, a telepresença, a realidade aumentada e o imersivo (convencionalmente conhecido por realidade virtual tradicional)

A presença cognitiva na realidade virtual imersiva é um importante aliado do processo de ensino-aprendizagem, à medida que dá ao sujeito a sensação de estar no lugar proposto: "o participante sente que o mundo virtual é 'válido', embora seja uma forma de realidade diferente" (SOUSA, 1988, Internet via WWW).

Como destaca SOUSA, os ambientes de aprendizagem em realidade virtual apresentam características desejáveis para o ensino, ou seja:

• A realidade virtual suporta verdadeiro aprender-fazendo.

• Os estudantes podem ativamente controlar o ambiente e diretamente experimentar o comportamento dos objetos no mundo virtual.

• A VR é tridimensional o que permite a imersão no mundo virtual. Esta vantagem tem o potencial de permitir ao aluno alargar a sua aprendizagem aos fenômenos que são tridimensionais ao mesmo tempo que permite a este estar tão perto da experiência quanto queira para se aperceber de pequenos detalhes.

• A VR permite a comunicação multi-sensorial. O estudante pode ver, ouvir ou sentir fatores invisíveis que afetam o comportamento de objetos. Os aprendizes podem aperceber-se de abstrações que não podem no mundo real. A estimulação multi-sensorial é muito importante no processo de aprendizagem e de memorização. (1998, Internet via WWW)

 

A utilização da realidade virtual facilita a construção do conhecimento a partir da análise, da crítica, da investigação e das reconsiderações das proposições apenas com o acompanhamento do professor que passa a caracterizar a sua função como a de um motivador/moderador ao invés do antigo papel de transmissor de conhecimentos. O ambiente de realidade virtual permite que o usuário construa novos conhecimentos interagindo diretamente num meio onde os riscos reais podem ser afastados em função dos objetivos do estudo em questão.

Assim como no mundo real a aprendizagem se dá em várias frentes, ou seja, mesmo quando estamos aprendendo uma disciplina específica o conteúdo pode levantar questões pessoais de experiências anteriores tornando o tema mais significativo, o mesmo acontece com a realidade virtual, à medida que trata com sensações e sentidos à semelhança do real com o qual se estabelece analogias. CAMACHO salienta:

A visão e a audição, que se desenvolvem no mundo físico de maneira quase inconsciente são, dentro do ambiente virtual, estimuladas de forma diferente e mais profunda; os nossos sentidos são como que 're-educados', adaptando-se a uma realidade diferente, habituando-se a ver, ouvir e sentir de uma forma nova, mais cuidada e consciente. (1998, Internet via WWW)

 

A realidade virtual não -imersiva é mais restritiva, porém economicamente mais viável, por dispensar os periféricos específicos que potencializam a sensação do usuário de estar imerso num ambiente sintético. Se por um lado esta modalidade é mais restritiva sensorialmente, por outro pode gerar menos enganos na aprendizagem, decorrentes de um emprego não equilibrado de fenômenos peculiares nestes mundos, como ausência de resistência dos sólidos, deslocamento aéreo do observador no instante que desejar, rotação de objetos, etc. A demonstração – através de simulações – de projetos, equações, moléculas, universos reais ou imaginários infinitamente grandes ou pequenos, é apenas o primeiro passo para a experimentação da realidade virtual; enganando nossa percepção com um ambiente do qual podemos nos aproximar ao máximo, explorando-o por diferentes ângulos, distâncias e posições, independentemente das suas dimensões, podem-se produzir situações profundamente desestabilizadoras, mesmo que inadvertidamente, por isso deve-se estar atento para as proposições e usos dos ambientes de realidade empregados na educação.

A realidade virtual além de favorecer a experimentação de situações apenas viáveis na imaginação humana, incentiva a participação ativa dos estudantes à medida que oferece um espaço virtual tridimensional para ser explorado criativa e intencionalmente, e é esta a característica que mais interessa neste estudo.

Sentir-se integrado a um ambiente qualquer, seja virtual seja real, é o primeiro passo para a participação colaborativa. A construção do conhecimento é resultado de uma interação contínua do sujeito com o objeto num processo de relações recíprocas, que Piaget (1990) denomina de adaptação. O processo de adaptação é a busca do sujeito de interação com o meio do qual faz parte, sabendo-se que as transformações do organismo em função do meio conduz a continuidade do intercâmbio sujeito/objeto, estando a elaboração de conhecimentos novos diretamente relacionada a esta rede de relações recíprocas que se estabelece entre os dois.

A interação leva o aluno a uma postura mais reflexiva em relação ao conteúdo que está sendo desenvolvido, como conseqüência da sua atitude ativa na construção do conhecimento que não lhe é fornecido pronto, mas construído cooperativamente entre todos os integrantes do ambiente de realidade virtual. O ambiente de realidade virtual, mais que qualquer outro ambiente virtual propicia a interação, à medida que propõe um cenário tridimensional para a atuação do usuário que terá de fazer suas escolhas num espaço, à semelhança da realidade que ele habita, e não num plano de representação bidimensional.

 

 

• A Percepção na construção do Conhecimento

A utilização da realidade virtual exige uma visão mais ampla do processo perceptivo na construção do conhecimento, visto que o sujeito estabelece relações tanto com o seu meio concreto quanto com a realidade virtual intermediada pelo computador.

A percepção tem sido tema de interesse para a compreensão do conhecimento humano desde a antigüidade. A concepção clássica pressupõe um trabalho intelectual de julgamento das sensações experimentadas pelo sujeito que percebe o meio e os objetos, relacionando assim, sensações, conceitos de espaço e de causalidade. Temos então, que a percepção, neste ponto de vista, é uma atividade cognitiva elaborada por várias correlações. Ou seja, ela se apresenta como uma regra estabelecida sobre o observável.

Outras teorias procuram explicar a relação da percepção com a cognição, entre elas, temos a visão de Piaget que desenvolveu uma teoria, na qual os consecutivos contatos do sujeito com o elemento percebido são importantes na construção do conhecimento sobre o objeto, permitindo, desta maneira, múltiplos modos de perceber na sua relação com o espaço/tempo.

O trabalho de Piaget sobre a percepção apresenta duas grandes divisões: a teoria da percepção – que determina um modelo probabilístico de como funciona a percepção a partir de elementos estímulos – e a teoria sobre a percepção – que é uma visão geral sobre a percepção e seu desenvolvimento, fundamentalmente sobre a sua relação com a inteligência. FLAVELL esclarece:

" Para Piaget la percepción es un tipo particular de acto o proceso adaptativo que sólo puede comprender-se en relación com la clase más amplia de actos o procesos a los que llama inteligencia. La teoría relativa a la percepción, entonces, es una teoría acerca de cómo son las estructuras perceptuales, en relación con las estructuras intelectuales, de dónde y cuándo se originam, en relación con los orígenes de la inteligencia, y de como se desarrollan y combian, en relación y en interacción con el desarrollo intelectual." (s/d p. 245)

A percepção envolve um pouco mais que a simples sensação, contudo não compreende juízos, inferências, classificações e reorganizações. No processo de adaptação, a percepção está subordinada, tanto evolutivamente quanto estruturalmente, à inteligência. FLAVELL explica:

" ... Piaget cree que la percepción surge en el desarrollo no como un modo autónomo de adaptación por propio derecho, sino como una especie de subsistema dependiente dentro del contexto mayor de una inteligencia sensorio-motora en desarrollo." (s/d p. 252)

Nas palavras de Flavel, a percepção é sempre aproximativa, probabilística, uma vez que as considerações são sempre relativas ao contexto, não alcançam estados de equilíbrio estáveis, podendo sempre assumir novos valores possíveis de serem considerados em novas formulações.

Piaget usa o conceito isomorfismo parcial para mostrar a semelhança entre a percepção e a inteligência no sentido da primeira sempre trazer indícios elementares das futuras elaborações conceituais da segunda, sendo aquela necessária, talvez até como causal, mas apenas primária no sentido de apresentar os elementos primordiais dos quais se valerá a inteligência para a construção de novos conceitos, sempre reversíveis em sua formulação final – a percepção é tida como semi-reversível pois atinge apenas um equilíbrio relativo.

Assim, para Piaget, a percepção é mais quantitativa do que qualitativa em relação à inteligência. Ela está mais associada à aparência do mundo concreto, com suas contínuas transformações. A percepção é uma forma de acomodação, numa aplicação prática dos esquemas da inteligência. FURTH pondera:

"A atividade acomodativa transforma o organismo segundo as características particulares do input. Quando este input, como é o caso da percepção, consiste em dados sensoriais, faz parte da atividade acomodativa ajustar-se à configuração particular dos dados. Pode-se observar literalmente esta correspondência com o estado externo na acomodação dos órgãos dos sentidos, como, por exemplo, na adaptação do olho às diversas características visuais de um objeto visto, a sua distância, luminosidade e forma." (s/d, p. 161)

 

Para Piaget, a percepção pressupõe um conhecimento operativo, sendo portanto uma manifestação da inteligência no seu desenvolvimento total. Ele aplica o termo percepção:

"quando o objeto do conhecimento está imediatamente presente para os sentidos. [...] Por conseguinte, Piaget estuda a percepção de forma tal, que o aspecto operativo que cerca o conhecimento figurativo é minimizado. Ao ato cognitivo que resulta em percepção no sentido restrito do termo, como foi assinalado, Piaget designa 'atividade perceptiva'. " (FURTH, s/d, p. 163)

 

FURTH continua:

Na verdade, as regulações operacionais nada mais são do que uma evolução adicional das regulações perceptivas. As regulações operacionais envolvem implicação estrita e conceitos generalizáveis; as regulações perceptivas envolvem as incertezas inerentes aos encontros perceptivos." ( s/d, p.166)

A construção do conhecimento se dá numa relação de interação entre o sujeito e a realidade que o circunda, sendo elaborado no processo de assimilação/acomodação que se vale tanto da percepção – como dado primário, mas não único e independente – quanto das operações conceituais anteriores que forjaram a capacidade perceptiva do momento, viabilizando as contínuas formulações/reformulações do pensamento conceitual.

 

 

Bibliografia Consultada

 

CAMACHO, Maria de Lurdes A. S. M. Realidade Virtual e Educação. Disponível na Internet via WWW. 1998.

FLAVELL, John H. La Psicología Evolutiva de Jean Piaget. Buenos Aires: Paidós, s/d.

FURTH, Hans G. Piaget e o Conhecimento: fundamentos teóricos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, s/d.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Merleau-Ponty na Sorbonne: resumo de cursos psicossociologia e filosofia. Campinas: Papirus, 1990a.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Merleau-Ponty na Sorbonne: resumo de cursos filosofia e linguagem. Campinas: Papirus, 1990b.

PIAGET, Jean & INHELDER, Barbel. A Psicologia da Criança. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995.

PIAGET, Jean. Epistemologia Genética. São Paulo: Martins Fontes, 1990.

_____. A Construção do Real na Criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.

PINHO, Márcio Serolli. .Introdução à Realidade Virtual. Disponível na Internet via WWW. 1998b URL http://www.inf.pucrs.br/~grv/introd.htm

SOUSA, Luis M. A Realidade Virtual em Micromundos Educacionais. Disponível na Internet via WWW. 1998. URL http://camoes.ml.ist.utl.pt/~ic-eac/POR/Seminarios/LuisSousa/vreduc2_lmcs.html